Por que os gols de falta no futebol estão diminuindo?

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Imagem por Sepp por Pixabay

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No passado, era comum os torcedores temerem alguns excelentes cobradores de bolas paradas. Afinal, Zico, Neto, Marcelinho Carioca e Rogério Ceni eram especialistas que tornavam as faltas em chances claras de gol. No entanto, atualmente, comemorar os gols de falta tornaram-se eventos cada vez mais raros no país do futebol.

O gráfico abaixo, evidencia a queda de 2011 a 2020 no campeonato brasileiro. Com exceção da edição de 2021, são 62% de gols a menos nos últimos 8 anos.

Diante disso, quem são os culpados por essa redução?

Diminuição na quantidade de infrações

Segundo a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), o jogo está cada vez menos faltoso, dado que, de 2015 a 2019, houve uma diferença de 130 faltas marcadas no Brasileirão. Uma das justificativas para isso, trata-se da evolução tática do jogo.

Conforme o livro de Israel Teoldo da Universidade Federal de Viçosa, a tática no futebol significa gestão do espaço. Dessa forma, os jogadores atuais administram o espaço onde se localizam de forma mais eficaz, proporcionando, portanto, melhores distâncias entre eu-companheiro (cobertura defensiva) e eu-opositor (contenção), para disputar a bola sem atraso e, consequentemente, evitar faltas involuntárias.

Evolução da barreira

Pesquisadores do Imperial College London, revelam o aumento de 4 cm na altura média de jovens brasileiros nos últimos 35 anos, devido, principalmente, a maior disponibilidade de alimentos e a menor exposição a doenças no ano de nascimento.

O crescimento mencionado acima também foi notado nas seleções brasileiras de 1970 a 2018. De 1970 a 1994, a altura média correspondia a 1,77cm. Já de 1998 a 2018, a mesma medida aumentou para 1,81cm.

Seguindo a mesma lógica evolutiva, uma análise realizada por quem vos escreve, observou um comportamento padrão positivo na barreira atual, que antigamente era pouco desempenhado.

No total, estudamos 60 cobranças de faltas, divididas em dois grupos com 30 gols em cada: finalizações antigas e finalizações atuais. Em 20 dos 30 gols realizados no passado, a barreira preferiu se manter estática. Entretanto, nas 30 cobranças atuais analisadas, a barreira optou 27 vezes pelo salto. Veja alguns exemplos no vídeo abaixo:

Mas, por que esse deslocamento não acontecia com tanta frequência?

Conversando com alguns preparadores de goleiros inseridos em clubes brasileiros, podemos concluir que antigamente era instruído para a barreira permanecer imóvel, pois quanto mais movimentos os jogadores realizavam, mais o guarda redes era prejudicado. A julgar pelas situações em que os atletas abrem a barreira e permitem o gol adversário.

No entanto, com o passar dos anos, verificamos que, quando devidamente coordenada para o salto, a barreira tende a ajudar o goleiro através de cabeceios. Desse modo, esses novos constrangimentos do futebol moderno dificultam a acurácia nas batidas, e consequentemente, resultam em menos gols de falta.

Prevenção de lesões

Muito se fala da interferência dos fisiologistas e preparadores físicos, perante as cobranças de bolas paradas após a sessão de treino. Afinal, essa intervenção se torna compreensível, após considerarmos a exigência física do jogo atual, somada com as viagens desgastantes em um calendário repleto de competições.

Enquanto na década de 70, o jogador profissional percorria de 4 a 7 km/jogo, o atleta atual se desloca entre 9 e 11 km/jogo, afirma o fisiologista do São Paulo F.C.

Portanto, o cuidado da comissão técnica precisa ser imposto para haver equilíbrio entre sobrecarga e volume no momento ideal da semana.

À vista disso, uma alternativa seria dividir a quantidade total de cobranças de faltas nos dias da semana, havendo uma baixa intensidade, mas com treinos constantes.

Contudo, em virtude do vasto conteúdo para ser abordado em tão pouco tempo, o técnico pode optar pelo treino de bolas paradas apenas um dia antes do jogo. Assim, a estratégia será convocar pelo menos 3 jogadores para praticar esse fundamento, visto que, a repetição alta poderá prejudicar o único cobrador daquele dia. Temos como exemplo o comentário do ex-jogador Neto, relembrando o treinamento de 70 cobranças diárias, mas sofrendo com lesões constantemente.

Avanço da tecnologia

Com o passar dos anos, métodos, equipamentos e softwares foram desenvolvidos de modo a corrigir os mínimos detalhes e garantir melhores performances. Cito a entrevista com o goleiro Weverton, conquistador do ouro olímpico de 2016, em que o pênalti defendido se deveu a um estudo dos analistas de desempenho para prever a batida do adversário.

Nesse sentido, a tecnologia facilita a antecipação de movimentos provocados pelos cobradores de bolas paradas, analisando, principalmente: pé dominante, biomecânica da finalização, velocidade do chute e canto preferido.

Portanto, assim como tudo na vida, o futebol também evolui. Dentro e fora de campo, as ciências do esporte contribuíram para um jogo mais desenvolvido nas últimas décadas. Basta assistir à uma partida de 40 anos atrás e, posteriormente, observar um jogo atual. Não há período melhor ou pior, cada contexto é único. Logo, seria injusto inserir parâmetros modernos no futebol mais longevo, e vice-versa.

Por que os gols de falta diminuíram?

Os tempos são outros e, com a influência contextual, as tendências vêm e vão. Hoje, vimos apenas alguns argumentos sobre a atual dificuldade de gols de falta, dentre eles: menor quantidade de infrações marcadas, evolução estrutural e técnica da barreira, cuidado com as lesões e avanço da tecnologia.

Os especialistas nessas cobranças estão sumindo, mas será que a especialidade passou a ser outra e você ainda não a enxergou?

Confira abaixo um episódio do Podcast sobre o assunto:

Fontes e Referências

https://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Times/Selecao_Brasileira/0,,MUL1383500-15071,00.html

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João Bonfatti

João Bonfatti atualmente trabalha como Coordenador do setor de Análise de Desempenho no América-MG. Antes disso, teve passagens pelo Vasco da Gama, onde atuou em diferentes categorias: foi auxiliar técnico do Sub-20, treinador interino do Sub-17 e auxiliar técnico do Sub-17.

Atuou também pelo Atlético-MG, onde desempenhou o papel de auxiliar técnico do Sub-15. No Corinthians, auxiliar técnico do Sub-14, além de exercer a função de supervisor metodológico.

Sua formação inclui o Bacharelado em Futebol pela Universidade Federal de Viçosa e a Licença B da CBF Academy, o que reforça sua base teórica e prática no desenvolvimento de atletas.

Felipe Bonholi

Felipe Bonholi integra a equipe do Palmeiras como Analista de Desempenho no Centro de Formação de Atletas (CFA), contribuindo para o desenvolvimento e acompanhamento de jovens talentos.

Antes disso, acumulou cinco anos de experiência na Ferroviária, onde atuou como Analista de Desempenho da equipe profissional, e no São Carlos Futebol Clube na mesma função.

Sua formação acadêmica inclui Bacharelado em Administração de Empresas pela UNIARA (2014–2017) e graduação em andamento em Educação Física pela mesma instituição, iniciada em 2019.

Com sólida base teórica e ampla experiência prática, Felipe Bonholi se destaca por sua capacidade de integrar análise técnica, gestão e visão estratégica no contexto esportivo, contribuindo para o desempenho e evolução de atletas e equipes.

Mylena Baransk

Mylena Baransk é doutora em Educação Física pela Universidade Federal do Paraná e mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, onde também concluiu sua graduação em Educação Física – Bacharelado. Especialista em futsal com foco em análise de desempenho, atuou como docente em cursos do ensino superior e analista de desempenho no futebol.

Atualmente, exerce a função de analista de desempenho no Clube Atlético Mineiro, onde trabalha desde agosto de 2024. Antes disso, desempenhou a mesma função na Associação Ferroviária de Esportes entre março e agosto de 2024, atuando em Araraquara, São Paulo.

Além da atuação em clubes, possui experiência acadêmica como docente, tendo lecionado na UniCesumar entre julho e outubro de 2023, em Curitiba, Paraná. Também foi professora na UNIFATEB, onde atuou por quase três anos, de fevereiro de 2021 a outubro de 2023, em Telêmaco Borba, Paraná.

Com forte presença na área de análise de desempenho no futebol, também é CEO da Statisticsfut, onde se dedica ao desenvolvimento de conteúdos e estratégias voltadas à análise estatística e desempenho esportivo.

Nathália Arnosti

Nathália Arnosti é uma profissional de destaque na área de Fisiologia do Esporte e Preparação Física, com sólida formação acadêmica e ampla experiência no futebol brasileiro.

Bacharel e mestre em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba e doutora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ela construiu uma carreira marcada pela integração entre ciência e prática esportiva.

No cenário dos clubes, já contribuiu com equipes como Athletico Paranaense, Red Bull Bragantino, Palmeiras, Audax, Ferroviária e Ponte Preta. Em janeiro de 2024, assumiu o cargo de fisiologista do Cruzeiro, reforçando seu papel como referência no acompanhamento e otimização do desempenho esportivo.

Rodrigo Aquino

Rodrigo Aquino é professor na Universidade Federal do Espírito Santo, onde atua no Departamento de Desportos e como docente do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (Mestrado e Doutorado).

É líder do Grupo de Estudos Pesquisa em Ciências no Futebol (GECIF/UFES) e coordenador do Programa Academia e Futebol (Núcleo UFES), financiado pelo Ministério do Esporte. Seu trabalho envolve a coordenação de projetos técnico-científicos em parceria com categorias de base e equipes profissionais de futebol no Brasil.

Rodrigo é graduado em Educação Física e Esporte pela USP, com especialização em Ciências do Desporto pela Universidade do Porto. Concluiu o mestrado e doutorado em Ciências também pela USP. Acumula experiência prática no futebol desde 2015 como fisiologista e preparador físico em clubes profissionais, além de atuar como treinador e coordenador técnico em categorias de base. Reconhecido academicamente, está entre os 10 cientistas do esporte mais produtivos da América Latina em publicações científicas relacionadas ao futebol.

Neto Pereira

Neto Pereira é um profissional de preparação física e performance esportiva com experiência em clubes do Brasil e do exterior. Atualmente é Preparador Físico no sub-20 do Vasco da Gama.

Trabalhou como Head Performance and Fitness Coach no FC Semey do Cazaquistão (2024). Foi Preparador Físico no Confiança (2023-2024) e Head of Performance and Health no Avaí (2022-2023). Também exerceu o cargo de Coordenador de Performance no Confiança (2022) e trabalhou como Fisiologista no CRB (2021-2022) e no próprio Confiança (2019-2021).

Possui Mestrado em Saúde e Educação Física pela Universidade Federal de Sergipe e Especialização em Desempenho Humano pela Universidade Tiradentes (Unit). Suas principais competências incluem preparação física, análise de desempenho, força, potência e velocidade no esporte.

Rafael Grazioli

Rafael Grazioli, natural de Canoas (RS), é formado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde também concluiu mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano.

Com nove anos de experiência atuando como coordenador científico e fisiologista no futebol profissional, ele passou as últimas três temporadas no Guarani de Campinas (SP) antes de ser anunciado pelo Criciúma em janeiro de 2025.