A concentração no futebol

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Foto de Omar Ram na Unsplash

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A concentração no futebol é um termo muito abordado. Porém, será que todos entendem o conceito de concentração da mesma forma? Além disso, existem maneiras de melhorar a concentração no futebol?

Durante um jogo de futebol, inúmeros estímulos são apresentados ao atleta, por exemplo: visuais (a bola, os adversários, companheiros), auditivos (gritos de companheiros, do treinador, som dos adversários se aproximando), e táteis (contatos). E dentre esses estímulos, o jogador deve selecionar os mais importantes para cada situação, já que é impossível “dar conta” de tudo.

O que é a concentração no futebol?

Primeiramente, uma definição útil de concentração no contexto esportivo e do exercício contém quatro partes:

  1. Focalização nos sinais relevantes no ambiente (atenção seletiva);
  2. Manutenção daquele foco de atenção por todo o tempo;
  3. Consciência da situação e dos erros de desempenho;
  4. Mudança do foco de atenção quando necessário.

Em outras palavras, a focalização nos sinais relevantes significa estar atento aos elementos do jogo (bola, jogadores, linhas de defesa, etc). E a manutenção do foco de atenção é a capacidade de permanecer “ligado” nesses elementos o tempo todo.

Contudo, como funciona o foco de atenção?

Em resumo, o foco de atenção pode ser classificado em amplo ou estreito, e interno ou externo.

  • Foco de atenção amplo: permite ao indivíduo a percepção de diversas ocorrências em simultâneo. Por exemplo: a bola, os companheiros e adversários, simultaneamente.
  • Foco de atenção estreito: ocorre quando o atleta reage a apenas um ou dois indicadores. Por exemplo: o atleta só foca na bola e no adversário à sua frente.
  • Foco de atenção interno: é dirigido ao interior. Exemplo: pensamentos, sentimentos.
  • Foco de atenção externo: dirige a atenção externamente para um objeto. Exemplo: a bola, os movimentos de um adversário.

Desse modo, durante a partida situações completamente diferentes podem ocorrer, requerendo do atleta a mudança de foco em alguns momentos. Estando concentrado no jogo, o atleta consegue alternar os focos de atenção de maneira a otimizar seu rendimento. Para tanto, o atleta deve estar consciente da situação e dos seus erros de desempenho, mantendo o foco de atenção nos sinais mais relevantes para cada situação.

Problemas de atenção comuns

Os problemas de atenção podem ser classificados como provenientes de distrações internas ou externas. As distrações internas incluem pensar em eventos passados ou futuros, “amarelar” sob pressão, sentir fadiga, ter falta de motivação e analisar de maneira excessiva a mecânica corporal. E as distrações externas incluem dois fatores: os visuais, como a torcida; e fatores auditivos, como o ruído da torcida ou provocações de jogo do adversário.

Nesse sentido, as distrações citadas levam à perda do foco de atenção e consequentemente queda no rendimento. Quando um atleta se preocupa excessivamente com um “jejum” de gols, ou quando ele “cai na pilha” do adversário, sua concentração nos elementos importantes da partida diminui, fazendo com que ele não consiga ter uma atuação no seu melhor nível.

Outro aspecto importante e mais atual da concentração no futebol é referente à questão cognitiva. Segundo Larry Rosen, professor da Universidade Estadual da Califórnia, o uso de celulares afeta a capacidade de concentração. Em outras palavras, o uso excessivo de celular diminui o tempo médio da capacidade de concentração. Por isso, entre outros motivos, vários treinadores como Guardiola, Christophe Galtier (Lille), Miguel Ángel Ramirez por exemplo, proíbem o uso de celulares nas dependências dos clubes e em dias de jogos. A medida estimula também a interação entre os atletas.

Melhorando a concentração no futebol

Existem formas de melhorar individualmente a concentração no futebol através do treinamento de habilidades psicológicas (THP). Outras alternativas mais abrangentes para atletas e comissões técnicas são:

  • O treinamento simulado, cujo objetivo é tentar criar um ambiente o mais próximo da competição real;
  • O uso de palavras sugestivas que tenham a função de instruir ou motivar, facilitando a concentração na tarefa em questão. Entretanto, essa prática necessita de embasamento, sendo conhecida e treinada com alguma função sabida por atletas e treinador. Mas não adianta só gritar à beira do campo “concentra, concentra!”;
  • Estabelecimento de rotinas, usadas para focalizar a atenção, reduzir a ansiedade, eliminar as distrações e aumentar a confiança;
  • Os planos de competição, que ajudam os atletas a se prepararem para os eventos e o que fazer em circunstâncias diferentes;
  • Aprender bem as habilidades. Em síntese, quando se aprende bem as habilidades necessárias para jogar futebol, estas ficam automatizadas. Isso faz com que o jogador não fique “pensando” em como vai executar um movimento, por exemplo. Dessa forma, ele consegue gerar uma “economia cognitiva”, fazendo com que ocupe mais o foco da atenção com elementos mais importantes.

A concentração, portanto, é um componente importantíssimo para a chegada e manutenção do alto rendimento. Está intimamente ligada com a atenção e também é influenciada por fatores como estresse, ansiedade e ativação. Apesar do amplo uso do termo, nem todos os profissionais compreendem bem o conceito e de que maneira funciona a concentração.

Nesse sentido, faz-se necessário aos profissionais do futebol compreender este e outros aspectos psicológicos do jogo, a fim de desenvolver de maneira global os atletas. Assim, com alternativas simples como as descritas acima, há a possibilidade de desenvolver a concentração.

Fonte e Referência:

Fundamentos da Psicologia do Esporte e do Exercício.

Contato do autor:
E-mail: matheuspadilhaar@gmail.com
Instagram: @28padilha

Confira abaixo um episódio em nosso Podcast sobre o assunto:

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Rodrigo Aquino

Rodrigo Aquino é professor na Universidade Federal do Espírito Santo, onde atua no Departamento de Desportos e como docente do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (Mestrado e Doutorado).

É líder do Grupo de Estudos Pesquisa em Ciências no Futebol (GECIF/UFES) e coordenador do Programa Academia e Futebol (Núcleo UFES), financiado pelo Ministério do Esporte. Seu trabalho envolve a coordenação de projetos técnico-científicos em parceria com categorias de base e equipes profissionais de futebol no Brasil.

Rodrigo é graduado em Educação Física e Esporte pela USP, com especialização em Ciências do Desporto pela Universidade do Porto. Concluiu o mestrado e doutorado em Ciências também pela USP. Acumula experiência prática no futebol desde 2015 como fisiologista e preparador físico em clubes profissionais, além de atuar como treinador e coordenador técnico em categorias de base. Reconhecido academicamente, está entre os 10 cientistas do esporte mais produtivos da América Latina em publicações científicas relacionadas ao futebol.

Neto Pereira

Neto Pereira é um profissional de preparação física e performance esportiva com experiência em clubes do Brasil e do exterior. Atualmente é Preparador Físico no sub-20 do Vasco da Gama.

Trabalhou como Head Performance and Fitness Coach no FC Semey do Cazaquistão (2024). Foi Preparador Físico no Confiança (2023-2024) e Head of Performance and Health no Avaí (2022-2023). Também exerceu o cargo de Coordenador de Performance no Confiança (2022) e trabalhou como Fisiologista no CRB (2021-2022) e no próprio Confiança (2019-2021).

Possui Mestrado em Saúde e Educação Física pela Universidade Federal de Sergipe e Especialização em Desempenho Humano pela Universidade Tiradentes (Unit). Suas principais competências incluem preparação física, análise de desempenho, força, potência e velocidade no esporte.

Rafael Grazioli

Rafael Grazioli, natural de Canoas (RS), é formado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde também concluiu mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano.

Com nove anos de experiência atuando como coordenador científico e fisiologista no futebol profissional, ele passou as últimas três temporadas no Guarani de Campinas (SP) antes de ser anunciado pelo Criciúma em janeiro de 2025.