O papel do Psicólogo na comissão técnica

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Foto por leah hetteberg na Unsplash

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Sabemos que a comissão técnica de uma equipe de futebol conta com profissionais de diversas áreas, sendo algumas com maior ou menor interação com atletas. Isso se dá de acordo com a natureza de cada área do conhecimento.

Em particular, o papel do psicólogo no futebol não é bem definido para muitos dos profissionais que atuam no futebol. Embora algumas atribuições do Psicólogo sejam entendidas, muitas outras são desconhecidas.

Quais as possibilidades de intervenção de um psicólogo no futebol?

Quando se fala de Psicologia no Futebol a ideia mais comum é a da intervenção direta com atletas. Isso ocorre geralmente devido ao fato de a Psicologia ser comumente lembrada pela prática clínica.

No entanto, dentro da Psicologia do Esporte o profissional de psicologia pode ter diferentes atribuições e contribuir com equipes de formas distintas. Vejamos a seguir quais são as atribuições do psicólogo no futebol:

Elaboração de perfis psicológicos e aplicação de testes

O Psicólogo no futebol geralmente trabalha realizando avaliações psicológicas relacionadas ao esporte. Esse processo é conhecido como Psicodiagnóstico e serve de base para estabelecer perfis dos atletas. Esses perfis, por sua vez, indicam as maneiras mais adequadas de trabalhar com cada atleta.

Através de testes e outros métodos, o profissional avalia aspectos como concentração, atenção e estresse, por exemplo. Assim, consegue ter dados relativos aos construtos psicológicos que se correlacionam com o desempenho esportivo.

Desenvolvimento de treinamentos

O trabalho conjunto com treinador e demais membros da comissão suscita questões e amplia visões acerca dos processos de trabalho. Nesse sentido a multidisciplinaridade pode ocorrer no desenvolvimento de treinos analíticos que mesclem aspectos cognitivos e físicos/técnicos/táticos. Um exemplo disso são os treinos para melhorar a velocidade de tomada de decisão.

Trabalhos de transição

O psicólogo acompanha a transição de atletas da base para o elenco profissional, fornecendo suporte e tornando a transição mais tranquila. Lidar com mudanças, por vezes bruscas, envolvendo muito dinheiro, fama repentina, alteração de rotina, pode ser difícil para jovens atletas.

Desenvolvimento do Treinamento de Habilidades Psicológicas

O THP (treinamento de habilidades psicológicas) é uma série de métodos e técnicas que incluem exercícios como mentalização, controle da ativação, dentre outros. O treinamento é um processo de ensino-aprendizagem de trabalhar os aspectos psicológicos mais presentes no esporte.

Acompanhamento de atletas lesionados

Atletas lesionados tendem a um abatimento, desesperança, dificuldades de lidar com a quebra do ritmo e as incertezas relativas à carreira. Por isso um ponto crucial do trabalho com jogadores é auxiliar no processo de recuperação de atletas lesionados.

Trabalhos psicoeducativos

Equipes de esportes coletivos necessitam de fatores grupais como coesão, comunicação e liderança. Algumas dessas questões podem ser desenvolvidas ou aperfeiçoadas. Assim outra atribuição do Psicólogo é identificar as potencialidades e as vulnerabilidades desses aspectos nos atletas e no time. Posteriormente, adequar atividades e trabalhos psicoeducativos que contemplem o que fora observado.

Como inserir o psicólogo na comissão técnica?

Além de elaboração de perfis e realização de testes psicológicos, é crucial que o Psicólogo acompanhe a rotina do clube. Observações de treinos, jogos, preleções e até mesmo momentos de “resenha” são boas fontes de informação para o trabalho. Por isso o trabalho do Psicólogo requer uma interação com os atletas in loco.

Um exemplo interessante de situação derivada dessa aproximação Psicóloga/atletas ocorreu na Sociedade Esportiva Palmeiras. O técnico Abel Ferreira demonstra apreço pelo trabalho psicológico e estreita bastante a relação com a Psicóloga do clube. Por esse motivo, através de uma observação da Psicóloga e uma conversa com o treinador, foi criada uma forma peculiar de passar as informações aos atletas.

A psicóloga percebeu uma relativa dificuldade de entendimento de algumas instruções e sugeriu que o treinador desenhasse para os atletas. Após a sugestão, o treinador passou a trabalhar com mais elementos visuais para explicar aos seus atletas o que deseja. Abel costuma usar um “bloquinho” com desenhos de campos e entregar durante os jogos, além de utilizar cones em um campo desenhado no solo para instruir seus jogadores.

Esses são exemplos simples de como a presença mais próxima do Psicólogo pode fornecer elementos potencializadores ao trabalho da comissão técnica.

Quais as Dificuldades enfrentadas pela Psicologia do Esporte?

Uma das dificuldades enfrentadas é o desconhecimento das possíveis atribuições de um Psicólogo do Esporte. Esse desconhecimento, por vezes, restringe a atuação mais ampla que deveria ter o Psicólogo. Porém cabe ao próprio profissional realizar um trabalho “psicoeducativo” na medida do possível e revelar as contribuições que tem a oferecer.

Mesmo que em muitos lugares o futebol esteja submisso ao resultado “cru”, novas perspectivas sobre desempenho e sobre análises mais elaboradas estão ganhando força. Pensar o futebol como um esporte complexo, cheio de nuances e interdependente de profissionais de várias áreas é o primeiro passo para um bom trabalho.

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Confira abaixo um episódio do Podcast sobre o assunto:

Links e Referências:

https://cienciadabola.com.br/podcast/87-a-psicologia-do-esporte-no-futebol-joao-ricardo-cozac

https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0273.pdf

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Nathália Arnosti

Nathalia Arnosti é uma profissional da Educação Física com formação acadêmica sólida e experiência em alto rendimento esportivo.

Graduada pela Universidade Metodista de Piracicaba (2009), mestre pela mesma instituição (2012) e doutora pela Universidade Estadual de Campinas (2016), sua especialização concentra-se em Treinamento Desportivo, Fisiologia do Exercício e Avaliação Física.

Ao longo de sua carreira, trabalhou em clubes de futebol brasileiro, atuando como Preparadora Física e Fisiologista. Passou por equipes como Ponte Preta (2017), Ferroviária (2017-2018), Grêmio Audax (Libertadores Feminina 2018), Palmeiras (2019), Red Bull Bragantino (2020-2022) e Athletico Paranaense (2022-2024). Atualmente, integra o departamento de desempenho do Cruzeiro (desde 2024) como Sports Physiologist.

Neto Pereira

Neto Pereira é um profissional de preparação física e performance esportiva com experiência em clubes do Brasil e do exterior. Atualmente é Preparador Físico no sub-20 do Vasco da Gama.

Trabalhou como Head Performance and Fitness Coach no FC Semey do Cazaquistão (2024). Foi Preparador Físico no Confiança (2023-2024) e Head of Performance and Health no Avaí (2022-2023). Também exerceu o cargo de Coordenador de Performance no Confiança (2022) e trabalhou como Fisiologista no CRB (2021-2022) e no próprio Confiança (2019-2021).

Possui Mestrado em Saúde e Educação Física pela Universidade Federal de Sergipe e Especialização em Desempenho Humano pela Universidade Tiradentes (Unit). Suas principais competências incluem preparação física, análise de desempenho, força, potência e velocidade no esporte.

Rafael Grazioli

Rafael Grazioli, natural de Canoas (RS), é formado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde também concluiu mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano.

Com nove anos de experiência atuando como coordenador científico e fisiologista no futebol profissional, ele passou as últimas três temporadas no Guarani de Campinas (SP) antes de ser anunciado pelo Criciúma em janeiro de 2025.